A FENOMENOLOGIA COMO MÉTODO

04/05/2012 17:06

 

BREVES CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DA FENOMENOLOGIA E DO MÉTODO FENOMENOLÓGICO

Guilherme Saramago de Oliveira1

1 Professor da Universidade Federal de Uberlândia, Doutorando em Educação

2 Professora da Universidade Federal de Uberlândia, Doutora em Educação

Ana Maria de Oliveira Cunha2

Resumo:

Este artigo tem como objetivos, definir, contextualizar e caracterizar alguns dos pressupostos fundamentais da fenomenologia enquanto método de pesquisa qualitativa. Inicialmente, são apresentadas algumas idéias básicas da fenomenologia para, posteriormente, tratá-la como alternativa metodológica de investigação científica.

Palavras-chave:

 

Pesquisa qualitativa. Metodologia de pesquisa. Fenomenologia.

Abstract:

This article has as objective, to define, to contextualizar and to characterize some of basic estimated of the phenomenology while the method of qualitative research. Initially, some basic ideas of the phenomenology in order to, later, dealing with it as an methodological alternative for.

Key words:

 

Qualitative research. Methodology of research. Phenomenology.

Segundo Bello (2006), fenomenologia é uma palavra constituída por duas outras, ambas de origem grega.

 

"Fenômeno" significa aquilo que se mostra; não somente aquilo que se aparece ou parece. "Logia" deriva da palavra logos, que para os gregos tinha muitos significados: palavra, pensamento. (BELLO, 2006: 17-18).

Assim, a partir do significado das palavras de origem grega, "fenômeno" e "logia", Bello (2006) define, então,

 

fenomenologia como uma reflexão sobre um fenômeno ou sobre aquilo que se mostra. (BELLO, 2006: 18)

O termo fenomenologia foi usado pela primeira vez, de acordo com Dartigues (1992), na obra

 

Novo órganon (1764), de autoria de Johann Heinrich Lambert (1728-1777), com o sentido de teoria da ilusão sob suas diferentes formas.

Em 1770, Emanuel Kant (1724-1804), retoma o vocábulo fenomenologia, falando de

 

phaenomenologia generalis, para indicar a disciplina propedêutica que deveria preceder à metafísica. A palavra fenomenologia volta a ser utilizada por Kant em 1772, na denominada Carta a Marcos, esboço da obra intitulada de Critica da Razão Pura (1781).

Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831), em 1807, chama

 

fenomenologia do espírito, a ciência que considera a sucessão de diferentes formas ou fenômenos da consciência até chegar ao saber absoluto. Com Hegel, a partir do estudo do movimento do espírito, a fenomenologia define-se enquanto método e filosofia.

Para Wilhelm Friedrich Hegel, a fenomenologia do espírito representa a introdução ao sistema total da ciência: apresenta o devir do saber ou da ciência em geral. Merleau-Ponty (1973) afirma que:

no sentido hegeliano, a fenomenologia consiste, em suma, numa lógica do conteúdo: a organização lógica dos fatos não provém de uma forma que lhes seria superposta, mas é o conteúdo mesmo desses fatos que é suposto ordenar-se espontaneamente de maneira a tornar-se pensável. Uma fenomenologia é a vontade dupla de coligir todas as experiências concretas do homem e não somente suas experiências de conhecimento, como ainda suas experiências de vida de civilização, tais como se apresentam na história, e de encontrar, ao mesmo tempo, neste decorrer dos fatos, uma ordem espontânea, um sentido, uma verdade intrínseca, uma orientação tal que o desenvolver-se dos acontecimentos não apareça como simples sucessão. (PONTY, 1973: 25-26)

No início do século XX, com Edmund Husserl (1859-1938), conforme Dartigues (1992), a fenomenologia se consolida como uma linha de pensamento. A partir de Husserl, a expressão fenomenologia passou a ter um significado totalmente novo, e é com esse novo significado, que na época contemporânea este vocábulo é empregado.

Segundo Dartigues (1992), Husserl define a fenomenologia como

 

ciência dos fenômenos, sendo o fenômeno compreendido como aquilo que é imediatamente dado em si mesmo à consciência do homem. Para Husserl, a fenomenologia assume, principalmente, o papel de um método ou modo de ver a essência do mundo e de tudo quanto nele existe.

Para Dartigues (1992),

enquanto a fenomenologia do tipo kantiano concebe o ser como o que limita a pretensão do fenômeno ao mesmo tempo em que ele próprio permanece fora do alcance, enquanto inversamente, na fenomenologia hegeliana,o fenômeno é reabsorvido num conhecimento sistemático do ser, a fenomenologia hussserliana se propõe como fazendo ela própria, as vezes, de ontologia pois, segundo Husserl, o sentido do ser e o do fenômeno não podem ser dissociados. (DARTIGUES, 1992: 3).

Dartigues (1992), afirma que para Edmund Husserl, a fenomenologia é uma ciência rigorosa, mas não exata, uma ciência eidética (que busca a compreensão da essência) que procede por descrição e não por dedução. A fenomenologia se ocupa da análise e interpretação dos fenômenos, mas com uma atitude totalmente diferente das ciências empíricas e exatas. Os fenômenos são os vividos pela consciência, os atos e os correlatos dessa consciência.

A fenomenologia, de acordo com Dartigues (1992), é uma descrição daquilo que se mostra por si mesmo, de acordo com o principio dos princípios:

reconhecer que toda intuição primordial é uma fonte legitima de conhecimento; que tudo o que se apresenta por si mesmo na intuição deve ser aceito simplesmente como o que se oferece e tal como se oferece, ainda que somente dentro dos limites nos quais se apresenta.

 

 

(DARTIGUES, 1992: 14)

Vera (1983), afirma que o fenômeno é considerado o objeto da investigação fenomenológica e a intuição o seu instrumento para buscar o conhecimento. A intuição equivale à visão intelectual do objeto de conhecimento, do dado analisado, que é o fenômeno, ou seja, aquilo que se apresenta ao sujeito que o questiona.

A intuição só é possível devido à intencionalidade da consciência.

 

Toda consciência é consciência de algo é a máxima da fenomenologia, segundo Husserl.

De fato, o discurso filosófico deve sempre permanecer em contato com a intuição se não quiser se dissolver em especulações vazias. Esse retorno incessante à intuição originária, "fonte de direito para o conhecimento", Husserl o chama de o

 

princípio dos princípios. "Significações que não fossem vivificadas senão por intuições longínquas e imprecisas, inautênticas-se é que isso acontece através de intuições quaisquer-não poderiam nos satisfazer. Nós queremos voltar às coisas mesmas" (DARTIGUES, 1992: 14).

Sendo o fenômeno o objeto de investigação fenomenológica, para elucidar o seu significado, Martins et al. (1990), analisa a etimologia da palavra, afirmando que ela tem origem no grego

 

phainomenon e significa discurso esclarecedor a respeito daquilo que se mostra para o sujeito interrogador. É uma palavra que deriva do verbo phanesthai que tem o significado de mostrar-se, desvelar-se. Fenômeno é, então, tudo o que se manifesta, se desvela se mostra à consciência do sujeito que o questiona.

Um dos princípios básicos da fenomenologia, segundo Dartigues (1992: 18), diz respeito à intencionalidade da consciência. A consciência é sempre

 

consciência de alguma coisa, estando direcionada para um determinado objeto em análise. Por sua vez, o objeto também é sempre objeto-para-um-sujeito.

A consciência e objeto não são entidades isoladas, separadas na natureza, mas, configuram-se, respectivamente, a partir de sua correlação. (...)

 

Se a consciência é sempre consciência de alguma coisa e se o objeto é sempre objeto para a consciência, é inconcebível não admitir essa correlação, já que, fora dela, não haveria nem consciência nem objeto (DARTIGUES, 1992: 18).

Por intermédio da idéia de intencionalidade, de acordo com Aranha e Martins (1993), a fenomenologia busca a superação das tendências empiristas e racionalistas, visando eliminar a dicotomia experiência-razão no processo de elaboração do conhecimento.

Para Triviños ( 2002),

em geral, podemos dizer que "intenção" é a tendência para algo que, no caso de Husserl (...) é a característica que apresenta a consciência de estar orientada para um objeto. Isto é, não é possível nenhum tipo de conhecimento se o entendimento não se sente atraído por algo, concretamente um objeto. Para Husserl, a intencionalidade é algo puramente descritivo, uma peculiaridade íntima de algumas vivências. Desta maneira a intencionalidade característica da vivência determinava que a vivência era consciência de algo. (TRIVIÑOS, 2002: 45)

Segundo Aranha e Martins (1993), a fenomenologia opõe-se aos postulados empiristas e parte do pressuposto de que não há objeto em si, mas o objeto existe para um indivíduo, indivíduo esse que atribui diferentes significados ao objeto. Ao contrário das idéias racionalistas, a fenomenologia considera que não há consciência pura, totalmente isolada do mundo, mas toda consciência é consciência de alguma coisa existente no mundo.

A fenomenologia, conforme Dartigues (1992), não pressupõe nem o mundo natural, nem o sentido comum, nem as proposições da ciência, nem as experiências psicológicas. Coloca-se, antes de toda crença e de todo juízo, para explorar simples e puramente o dado que está sendo questionado pelo sujeito.

Martins e Bicudo (1983: 10) afirmam que a fenomenologia

procura abordar o fenômeno, aquilo que se manifesta por si mesmo, de modo que não o parcializa ou o explica a partir de conceitos prévios, de crenças ou de afirmações sobre o mesmo, enfim, um referencial teórico. A intenção da fenomenologia é abordar o fenômeno diretamente, interrogando-o, tentando descrevê-lo e procurando captar sua essência. (MARTINS; BICUDO, 1983: 10)

Dartigues, (1992), define essência, como a visão do sentido ideal que atribuímos ao fato materialmente percebido e que nos permite identificá-lo. As essências são dadas à intuição fenomenológica, que as transforma, desse modo, na apreensão de unidades significativas, de sentidos, ou objetos-sentidos, de universalidades.

A fenomenologia, afirma Triviños,

é o estudo das essências, e todos os problemas, segundo ela, tornam a definir essências: a essência da percepção, a essência da consciência, por exemplo. Mas também a fenomenologia é uma filosofia que substitui as essências na existência e não pensa que se possa compreender o homem de outra forma senão a partir de sua "facticidade". (TRIVIÑOS, 1992: 43)

Para Martins (1992) a essência objetivada pela fenomenologia não é um conteúdo conceitual passível de definição, mas uma significação da essência existencial, que como tal deve ser descrita. Essa descrição deve ser a mais natural e espontânea possível; não é opinião nem o que se pensa, mas aquilo que o sujeito está de fato vivenciando e compreendendo.

 

Buscar a essência não consiste em desenvolver uma semântica da consciência, fugindo dessa forma da existência, mas consiste em redescobrir a presença que se tem de si mesmo, o sentido e o significado dessa consciência (MARTINS, 1992: 61).

Segundo Triviños (1992), Edmund Husserl para obter êxito, em sua intenção de transformar a filosofia em uma

 

Ciência do Rigor, criou o método fenomenológico, que seria usado para o desenvolvimento da ciência das essências. Para Husserl, mediante o método fenomenológico, opera-se uma série de reduções até alcançar o resíduo das coisas, as essências ou eidos (idéias).

De acordo com o pensamento expresso por Masini (1989), não existe um único método fenomenológico, mas sim uma atitude do ser humano diante de cada fenômeno a ser analisado e compreendido. Atitude esta, de abertura do sujeito para apreender o

que de fato se mostra (procurando estar livre de conceitos ou pré-definições) no estudo do fenômeno.

Para Martins (1992), o método fenomenológico, busca a compreensão do fenômeno interrogado, não se preocupando com explicações e generalizações. O pesquisador não parte de um problema específico, mas conduz sua pesquisa a partir de um questionamento, de uma indagação acerca de um fenômeno, o qual precisa ser situado, ou seja, estar sendo vivenciado pelo sujeito.

O método fenomenológico argumenta Masini (1989), não pretende ser empírico ou dedutivo, mas descritivo. Esse método tem como finalidade a descrição do fenômeno em si, tal como ele se apresenta, sem reduzi-lo a algo que não aparece.

Do ponto de vista epistemológico, o método fenomenológico é contrário às idéias que isolam o sujeito ou o objeto para o desenvolvimento de estudos, concebendo-os como correlacionados. Há, portanto, o entendimento que numa relação entre sujeito e objeto, um não pode existir sem o outro.

Para Masini (1989), o método fenomenológico é centrado no ser humano, especificamente na análise do significado e relevância da experiência humana. O ponto de partida da investigação fenomenológica é a compreensão do viver do próprio homem.

O homem, segundo Masini (1989), imprime sentidos ao mundo, ao ser capaz de intuir, tendo intencionalidades, orientando significações sobre tudo aquilo que vai

 

experenciando em sua existência. Ao estabelecer significações para os objetos que analisa e interpreta, o homem une-se a eles.

A pesquisa fenomenológica, para Masini,

parte da compreensão de nosso viver - não de definições ou conceitos - da compreensão que orienta a atenção daquilo que se vai investigar. Ao percebermos novas características do fenômeno, ou ao encontrarmos no outro interpretações, ou compreensões diferentes, surge para nós uma nova interpretação que levará a outra compreensão. (MASINI, 1989: 63)

O método fenomenológico, conforme Masini (1989) apresenta consistência e legitimidade em estudos científicos que enfatizam a experiência vivida do homem e sua significação, principalmente, quando não é possível explicá-la por uma relação de causa e efeito, reduzindo-a, a normas, princípios, definições ou conceitos previamente estabelecidos.

Masini (1989) esclarece que:

o método fenomenológico trata de desentranhar o fenômeno, pô-lo a descoberto. Desvendar o fenômeno além da aparência. Exatamente porque os fenômenos não estão evidentes de imediato e com regularidade faz-se necessário a Fenomenologia. O método fenomenológico não se limita a uma descrição passiva. É simultaneamente tarefa de interpretação (tarefa da hermenêutica) que consiste em pôr a descoberto os sentidos menos aparentes, os que o fenômeno tem de mais fundamental. (MASINI, 1989: 63)

Gil (1995: 33) entende que a utilização do método fenomenológico

 

implica uma mudança radical de atitude em relação à investigação científica. Por essa razão é que embora muito comentado, o método fenomenológico não vem sendo muito empregado na pesquisa social.

Para pôr em prática o método fenomenológico, conforme Martins e Bicudo (1989), é necessário, frente ao fenômeno investigado, que o pesquisador assuma uma atitude radical, colocando entre parênteses ou em suspensão o mundo natural. A crença na realidade do mundo natural e todas as proposições que dessa crença possam ter origem, devem ser colocadas entre parênteses por meio da chamada epoché fenomenológica.

Para Martins et al. (1990), a epoché fenomenológica significa suspender, diante do fenômeno, as crenças referentes ao mundo natural. Significa que o pesquisador deve deixar de olhar o fenômeno de uma forma comum, abandonando os preconceitos e pressupostos em relação aquilo que está interrogando.

Na epoché, o pesquisador deve assumir uma atitude neutra, não no sentido de negar o mundo ou as experiências, mas sim, de refleti-los e questioná-los da maneira própria. Isso possibilita o emergir do sentido de fatos que não tinham sido antes adequadamente observados e analisados. Isso significa que por meio da epoché, apresenta-se um novo sentido à atitude natural.

O trabalho do fenomenólogo, depois de colocar o fenômeno entre parênteses

 

, consistirá em descrevê-lo tão precisamente quanto possível, procurando abstrair-se de qualquer hipótese, pressuposto, ou teorias. Busca-se exclusivamente aquilo que se mostra, analisando o fenômeno na sua estrutura e nas conexões intrínsecas (MARTINS, 1992: 56).

O método fenomenológico, para Martins (1992), consiste em reconsiderar todos os conteúdos da consciência humana. Ao invés de verificar se tais conteúdos são reais ou irreais, procede-se ao seu exame, enquanto puramente dados. Mediante a epoché, é possível à consciência fenomenológica ater-se ao dado, enquanto tal, e descrevê-lo em sua pureza.

O dado, em fenomenologia husserliana, é o correlato da consciência intelectual.

 

O dado não é o empírico e tampouco um material que se organiza através de categorias estabelecidas em forma apriorística e intuitivamente. Para Husserl não existe conteúdos da consciência, mas exclusivamente fenômenos. O dado é a consciência intencional perante o objeto (TRIVIÑOS, 2002: 43).

Na busca de desvelar o fenômeno e compreendê-lo, conforme Martins (1992), o investigador não parte de teorias ou explicações dadas a priori, mas do mundo-vida dos sujeitos que vivenciam o fenômeno em análise. Em outros termos, realizando a epoché, o pesquisador procura estabelecer um contato direto com o fenômeno estudado.

Tudo o que sei do mundo, mesmo devido à ciência, o sei a partir de minha visão pessoal ou de uma experiência do mundo a qual os símbolos da ciência nada significariam. Todo o universo da ciência é construído sobre o

 

mundo vivido e se quisermos pensar na própria ciência com rigor, apreciar exatamente seu sentido e seu alcance, convém despertarmos primeiramente esta experiência do mundo da qual ela é a expressão segunda (TRIVIÑOS, 2002: 43).

Nessa perspectiva, o pesquisador não parte de um referencial teórico previamente estabelecido. É por meio de suas experiências, do seu mundo-vida, que é possível ao investigador interrogar o mundo que o circunda em busca do entendimento do fenômeno.

Para Martins (1992), o que se objetiva na pesquisa fenomenológica são os significados que os sujeitos atribuem à sua experiência vivida, significados esses que se revelam a partir das descrições realizadas por esses mesmos sujeitos. A descrição da experiência por quem vivencia um fenômeno é o caminho para a compreensão dele, e a linguagem é uma das formas que se abre para essa compreensão.

Para Martins e Bicudo (1989: 45), a descrição

 

(...) tem o significado de des ex-crivere, isto é, de algo que é escrito para fora. A descrição de alguma coisa implica em diferenciá-la de outra, apontando seus atributos, elencando suas especificidades. Para que isso ocorra, o momento da descrição não pode ser compreendido como um

procedimento mecânico, mas como um encontro social, uma relação efetiva entre o pesquisador e o pesquisado, caracterizada pela empatia, intuição e imaginação.

Segundo Triviños (2002), essa forma de se pensar e conduzir a pesquisa apresenta em si à questão da subjetividade. Contudo, tanto o sujeito como o fenômeno estudado está no mundo-vida com outros sujeitos, que também percebem e vivenciam os fenômenos. Sujeitos que participam de experiências vividas em comum, compartilham entendimentos, interpretações, comunicações, estabelecendo-se assim, a esfera da intersubjetividade.

Um dos caminhos propostos de intersubjetividade, tem sido considerar que, quando falamos de um sujeito, não estamos pensando num sujeito como ente empírico, mas como sujeito puro, transcendente, um sujeito geral. Outra via de intersubjetividade está representada no reconhecimento explicito de que não existem diferenças substanciais entre o subjetivo e o objetivo, que ambas são expressões de uma mesma realidade (TRIVIÑOS, 2002: 43).

Para a fenomenologia nada é objetivo, antes de ter sido subjetivo, ou seja, é a subjetividade que permite alcançar graus de objetividade.

A idéia de consciência subjetiva pode ser ilustrada através da percepção. Uma percepção consciente abrange a consciência dos entes que estão no mundo, ou seja, do que é visto, ouvido ou sentido por um sujeito, assim como a consciência que se tem de estar ouvindo ou sentindo. Pode se distinguir na percepção consciente como seu aspecto tanto um estado de alerta para o mundo como um estado de alerta para a iluminação ou esclarecimento do mundo (MARTINS, 1992: 64).

Conforme Martins (1992), obtidos a descrição dos colaboradores da investigação, o pesquisador deve proceder à análise das mesmas. Entretanto, para tal, não existe um procedimento único, pronto, pré-estabelecido a ser rigorosamente seguido pelo investigador. Existem trajetórias que podem revelar caminhos adequados na busca da compreensão do fenômeno. Trata-se de um caminhar gradativo, relacionado ao próprio desenvolvimento da fenomenologia, enquanto alternativa metodológica de pesquisa nas ciências humanas e sociais.

Martins (1992) apresenta e descreve três momentos da trajetória fenomenológica:

 

a descrição, a redução e a compreensão.

A

 

descrição fenomenológica, segundo Martins (1992), compõe-se de três elementos: a percepção, a consciência que se dirige para o mundo-vida e o sujeito que se vê capaz de experimentar o corpo-vivido através da consciência.

Para Martins (1992), a

 

redução fenomenológica é o momento em que são selecionadas, por intermédio da variação imaginativa, as partes essenciais da descrição do sujeito pesquisado. O pesquisador imagina cada parte da descrição como estando presente ou ausente na experiência, até que a mesma seja reduzida ao essencial para a existência da consciência da experiência.

A redução tem como objetivo determinar, selecionar as partes da descrição que são consideradas essenciais e aquelas que não o são. Em outras palavras, deseja-se encontrar exatamente que partes da experiência são verdadeiramente partes da nossa consciência, diferenciando-se daquelas que simplesmente supostas (MARTINS, 1992: 59).

A compreensão fenomenológica, conforme Martins (1992) ocorre simultaneamente a interpretação. É o momento em que se pretende obter o significado essencial na descrição e na redução. O pesquisador assume o resultado da redução como um conjunto de asserções ou unidades de significado, que se mostram significativas para ele, apontando também para a experiência do sujeito, para a consciência que o sujeito tem do fenômeno.

Esta fase consiste em refletir sobre as partes da experiência que nos parecem possuir significados cognitivos, afetivos e conotativos e, sistematicamente, imaginar cada parte como estando presente ou ausente na experiência. Através da comparação no contexto e eliminações, o pesquisador está capacitado a reduzir a descrição daquelas partes que são essenciais para a existência da consciência da experiência (MARTINS, 1992: 60).

Martins (1992) esclarece que as unidades de significado identificadas na descrição, são inicialmente assumidas na linguagem própria do sujeito que descreve o fenômeno (discurso ingênuo), sendo depois transformadas em expressões próprias do discurso que sustenta o que está sendo buscado, por exemplo, um discurso psicológico, educacional, social. Posteriormente, é organizada, a partir da análise das descrições dos vários sujeitos da pesquisa, uma síntese das unidades de significado encontradas, sendo buscadas, então, suas convergências, divergências e idiossincrasias.

Para concluir, é importante ressaltar, de acordo com Martins (1992), que a trajetória do estudo fenomenológico tem a finalidade de estabelecer um contato direto com o fenômeno vivido pelo sujeito pesquisado. Para compreender esse fenômeno é necessário recorrer ao discurso, à descrição mais ampla do sujeito com o intuito de conseguir uma maior aproximação com a densidade semântica do fenômeno. Apenas um vocábulo, uma expressão, um conceito, uma definição não poderá expressar tudo o que há a ser falado em relação ao que se pretende investigar.

Referências :

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Filosofando: introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 1993.

BELLO, Ângela Ales.

 

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GIL, A. C.

 

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Um enfoque fenomenológico do currículo: educação como poésis. São Paulo: Cortez, 1992.

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Estudos sobre existencialismo, fenomenologia e educação. São Paulo: Moraes, 1983.

MARTINS, J. et al

 

. A fenomenologia como alternativa metodológica para pesquisa-algumas considerações. São Paulo: Cadernos da sociedade de estudos e pesquisa. Qualitativa, cad. 01, 1990.

MASINI, E. F. S. O enfoque fenomenológico de pesquisa em educação. In: FAZENDA, I.

 

Metodologia da pesquisa educacional. São Paulo: Cortez, 1989.

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TRIVIÑOS, Augusto N. S.

 

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Metodologia da Pesquisa Científica. Porto Alegre: Globo, 1983.

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